"Hello, Darkness, My Old Friend".

sábado, 9 de abril de 2011

Telefonia II

Quase na entrada da faculdade, os primeiros acordes de Shiver me sobressaltam.
- Oi, Mã.
(Não escrevi errado, não. É assim mesmo que eu falo).
- Oi, Mãe, que nada! É "Oi, Pai!".
- Ooooooii, Pai!
(Assumo que eu vivo chamando Mãe de Pai e Pai de Mãe, mas, desta vez, a culpa não foi minha: ele nunca me liga daquele telefone e nunca está em casa neste horário).
- Tudo bom, Nega?
- Tudo, Pai. E você? E a viagem?
- Foi boa. E minha filha?
(A insistência dos pais...)
- Estou bem, Pai, não precisa se preocupar.
(Minto descaradamente, sou uma ruína humana).

Trocamos mais algumas palavras.
Sei que Mãe está do lado dele prestes a lhe tomar o telefone. Ele decide passar para ela de uma vez:
- Fala aqui com sua Mãe.
- Oi, Mã.
- Oi, minha filha! Só queria te dizer que você é a filha mais amada do mundo, uma graça de Nossa Senhora, minha ninfa morena.
(Ninfa morena, às vezes ela me chama assim. Eu sei que é ridículo, não levem a mal).
Reflito que, qualquer dia, minha mãe vai entrar pelo telefone adentro. Tanta dedicação me comove. Não quero estragar o rímel, deu muito trabalho passar.
Fico na dúvida se peço a Melissa nova, resolvo pedir depois. Desista, PREX, não vou deixar de ser consumista por sua causa.

- Obrigada, Mã. Também amo você.
- Era só isso que eu queria te dizer. Boa aula.
- Tchal, Mãe.


Fiquei imaginando a cena:
(Minha Mãe, desligando o telefone, olhando para o céu tão claro que chega a doer a vista): Meu Deus, proteja minha filha!
(Meu Pai, olhando de esguelha, contrariado): Você nem me deixa falar com a menina!
Mãe olha para ele, suspira e entra em casa. Pai se encaminha lentamente para a rede, o piso do alpendre refletindo os últimos raios alaranjados do pôr-do-sol. Na copa das árvores, os passarinhos cantam desesperadamente.

Eu subo as escadas, avanço para as catracas. Hoje é sexta-feira, Amém!

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