"Hello, Darkness, My Old Friend".

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Encontro.

Uma das minhas especialidades é me livrar de coisas desnecessárias. Algumas até possuem serventia, mas eu acabo me convencendo de que avançar é mais fácil quando se leva apenas o essencial. Assim, hoje dei adeus à maletinha rosa das Meninas Superpoderosas (onde guardar tanto rímel agora?), à caixinha de plástico amarela em que eu depositava minha mesada, quando eu era criança; e a um coraçãozinho de alumínio onde eu tentava, sem sucesso, deixar as tarrachas dos brincos. Junto com tudo isso, foram embora outros tantos objetos inúteis, e eu fiquei com mais espaço para coisas novas - eis a vantagem.

Enquanto me ocupava dessa triagem no armário, achei uma folha escrita há mais de dois meses, cujo conteúdo estava, obviamente, destinado a este blog. Achei injusto desperdiçar uma postagem preparada desde tanto tempo e, por isso, ei-la aqui:

Estou sendo obrigada a me entregar completamente. Mas eu não tenho mais nada para oferecer.

Meu desempenho acadêmico sempre foi muito bom. Nunca me preocupei com notas. "Não tenho outras tarefas, tenho obrigação de ter boas médias" - digo, para me cobrar. Só sei viver se aceitar meus próprios desafios, e a intransigência é tanta que, frequentemente, perco as apostas que me faço.

Talvez esses sejam alguns dos motivos que me fazem ter certeza de que meu trabalho não está ficando bom como devia. Mas, vou tentar não pensar nisso agora.

Estou tão cansada, meu Deus! Durante três anos, me desesperei com trabalhos, provas, atividades, o diabo a sete (como Pai diria). Talvez, secretamente, eu soubesse que tudo ia dar certo. Que eu ia conseguir, afinal. Mas sempre preferi acreditar que ia tirar zero nas provas; que minhas Atividades Complementares seriam uma vergonha; que meus trabalhos seriam uma negação; e que eu ia pegar DP.

Tudo isso nunca passou de um pesadelo. E, mesmo assim, é impossível contar quantas lágrimas essas dúvidas me custaram. E eu ainda tenho muito para pagar.

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E é tudo, não havia mais nada escrito.
Foi bom ter encontrado essa página. Foi bom voltar a desconfiar de mim - tenho me deixado em paz, ultimamente.
Entre as razões dessa trégua, estão:
coleção nova da Kipling; coleção nova da Melissa; e leituras impagáveis (nas últimas semanas: Gabriela, Cravo E Canela; Contos Inacabados; O Amante; e As Mil E Uma Noites). Como se vê, tenho coisas bem melhores para me ocupar. Amém.



terça-feira, 19 de julho de 2011

Cartas.

Eu colecionava papéis de carta. Não faz muito tempo. Conservo a maioria deles, obviamente - não tenho destinatários. Para falar a verdade, até hoje não consigo resistir às papelarias.

É tão bom escrever para quem se gosta. Mesmo sem assunto. Você pensa na pessoa, pega a caneta que deixa sua letra bonita, pega o papel de carta todo decorado (e fica morrendo de pena de usá-lo), e vai enchendo as linhas. Geralmente, nada de extraordinário - mas que será uma lembrança para o resto da vida. Foi por isso que comecei a enviar cartas periódicas para Mãe e Pai. Antes, eu escrevia uma carta para cada um. Agora, escrevo uma só: fica subentendido que um pula a parte sobre bolsas, sapatos e vestidos, e outro não lê a parte sobre futebol (e, por falar nisso: São Paulo F.C., o que está acontecendo?).

Hoje, parece estranho escrever. Mas eu gosto de me sentir no passado, gosto de escrever, e enfim posso dar utilidade aos meus papéis de carta. O principal, no entanto, é que certos vocábulos, quando escritos, transmitem muito mais emoção do que quando falados. É o que eu acho.

Uma vez:

-Minha filha, seu pai chorou o dia inteiro.

[Sobressalto].

-Mãe, o que foi?

-Ele leu a carta que você mandou, chegou hoje.

-Aaah, Mã. Não era essa a intenção! E você?

-Li e chorei também.

[Pais...]


Enfim. Eles não têm tempo de me responder, é uma pena.

Há tempos, recebi uns cartões de uma amiga da Alemanha. Guardei dentro das "Folhas das Folhas de Relva" - o que prova o quanto eles são importantes para mim. É tão bom - abro o livro, e lá estão, entre as palavras de Whitman, aquelas que vieram de tão longe, escritas pela Sheila, e que eu releio junto com as do poeta de que Mr. Keating tanto gostava.

Aliás, com sua licença, farei isso mais uma vez agora. E até a próxima postagem.



quinta-feira, 14 de julho de 2011

Futuro.

Assumo de uma vez por todas: é meu diário, e não do PREX. Por mais que eu preze esse trabalho, sei que ele já regulou demais minha vida (e vai continuar assim, eu sei o quanto ainda vou chorar e me desesperar. Mas não quero pensar nisso agora).

O que eu vou viver até que minha vida desemboque no período que eu quero? Quanto falta para chegar lá? Pouco, como parece? Ou ainda vou entender Ulisses melhor do que nunca?

Agora eu tenho urgência por algo que, há tempos, venho deixando de lado - é como encontrar uma coisa que julgamos tão importante, mas tão importante, que relegamos ao esquecimento de uma gaveta, achando que ainda não é a ocasião certa para usufruir daquilo. E a minha gaveta já está cheia demais.

No final do ano (muito tempo ou pouco tempo?), o Projeto que nomeia este blog estará concluído e aprovado (assim espero). Eu terei longas, longas férias. As melhores que alguém pode ter. E depois? Depois, não vou mais querer meu quarto branco, ok, Mãe? E vou precisar desesperadamente de uma caixinha de música, não importa quanto trabalho eu tenha para encontrar uma que seja perfeita. Poucas delícias são maiores do que dar corda em uma caixinha de música.

Por um tempo, quero que meus pais esqueçam que eu tenho vinte anos. Mãe vai pentear meu cabelo antes que eu vá dormir. Pai virá me acordar, nos dias em que ele estiver em casa até mais tarde. Mãe vai comigo comprar Melissas (isso, sim, é um sonho). E eu vou deixar que ela escolha as que eu vou levar - Mãe sempre sabe. Pai e eu iremos ao Castelão, andaremos juntos nas estradas cheias de poeira, debaixo do sol sem piedade, rindo de coisas simples. Afinal, todos os cearenses são humoristas. Nem todos vivem disso, é claro. Mas todos são humoristas desde o berço, isso é certo.

Quanto tempo vai levar até que eu vá para Pasárgada?


segunda-feira, 11 de julho de 2011

Certeza.

Eu queria que tudo que eu faço fosse melhor. Desde sempre tive a sensação de que não tenho a habilidade suficiente para dar aos meus projetos algo de especial. Lamento a falta de qualidade, principalmente, do que eu escrevo (vide as aliterações da primeira frase). Mas até as menores coisas parecem do avesso depois que passam pelas minhas mãos. Quase um dom às avessas.

Um ideal é inalcançável. "Ideal" é a perfeição que não se pode atingir completamente. É possível, com muita dedicação, chegar perto - mas nunca viver sua plenitude. Sei que é assim, e não consigo aceitar: não tolero nenhum meio termo.

Vivo perseguindo um ideal e, provavelmente, nunca chegarei a vivê-lo.

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Remédio.

"Para, meu coração. Deixa o pensar na cabeça".

Assim disse Fernando Pessoa. Na verdade, um de seus heterônimos - li "Mensagem" (pela milésima vez) no sábado. Mesmo sabendo que não tenho mais tempo para essas coisas.

A aflição me deu insônia. Não posso mais suportar o sentimento permanente de "não está certo"; a voz que diz "você devia ter se esforçado mais, Leila. Agora, seu trabalho vai ser reprovado e você vai ficar mais e mais tempo longe de casa". O sono acumulado das duas semanas quase sem dormir não é suficiente para que eu possa adormecer em paz.

Não nego que estar aflito pode ser uma motivação. Mas o preço, meu Deus, o preço é alto demais. E eu estou farta de fingir que eu aguento.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Conhecimento.

Ontem, fiquei pensando no quanto é possível aprender com as pessoas ao nosso redor. No conhecimento que a vida nos dá a chance de adquirir, e desprezamos.

Tenho tanto para aprender! Inclusive com pessoas que nunca foram à escola por um dia sequer. Talvez eu nunca consiga alcançar nem um terço da ciência de Rogério - vaqueiro desde a infância. De Chico Leão, que jamais pôs os pés fora do Nordeste e sempre viveu da agricultura. Do falecido Otílio - que via os produtos da modernidade com um assombro ingênuo e sincero de que poucos filósofos seriam capazes.

Sei que não tenho comparação com estas pessoas.

E foi pensando assim que, finalmente, consegui me encontrar em um meio-termo. Sabe, eu gosto de ler Dostoiévski. Mas quão melhor é ler Dostoiévski nos alpendres da minha casa! No sertão, cercada pela aridez deslumbrante - em um lugar onde noções teológicas e filosóficas não são vitais e a vida acontece plena na sua simplicidade.

Quando o livro acaba ou a leitura cansa, posso ficar olhando pro céu, que fica laranja todos os fins de tarde, quando o sol se põe. E ter a certeza de que "a vida é uma agitação feroz e sem finalidade", mas, mesmo assim, há tantas coisas apreciáveis nela, e que são ainda mais bonitas porque não precisam de compêndios científicos.

Isso é viver, minha gente. E viver pode ser tão bom quanto uma manga rosa. Daquelas que você tira do pé e come ali mesmo, na sombra da mangueira. Olhando para os passarinhos, que não são racionais, e entretanto sabem apreciar melhor do que nós uma manga madura.

(Alberto Caeiro, você está me manipulando!)

terça-feira, 17 de maio de 2011

Mestres.

Essa será mais uma noite que irei atravessar incrementando meu briefing. Portanto, tenho que postar antes que comece a maratona. Escrevi ontem, esperando a aula começar. Lá vai:

Hoje não tem aula e ninguém me avisou? Por acaso explodiram o campus? Algum vírus altamente contagioso foi detectado no Tatuapé? Confesso que não queria que nada disso acontecesse. Queria apenas já estar formada, pronto.

Na rua, andando do ponto de ônibus até a faculdade, eu sempre imagino que não vai ter aula. Para me consolar. Nos meus melhores devaneios, fantasio que as aulas serão suspensas por uma semana. Depois, termino me convencendo de que isso não vai acontecer. Aqui não é Ramsdale e o entorno do campus só está assim vazio porque eu chego cedo demais.

Sou meio sistemática com alguns horários. Se for para me atrasar, prefiro nem ir. Confesso que só me comporto dessa maneira com coisas que são muito importantes para mim - indiretamente, acabo de demonstrar o quanto considero as aulas importantes.

Chegando mais cedo à Faculdade eu conheci mais e melhor todos os meus professores. E desenvolvi por eles aquela mesma admiração velada que eu sentia, quando criança, pelas princesas dos contos - por mais que as venerasse, eu sabia que dificilmente seria como elas. Sempre ia faltar algo de sublime que a minha natureza imperfeita jamais me permitiria possuir. Tanto tempo depois dos contos de fada, voltei a ter essa sensação.

Confesso que queria ter aprendido mais com cada um dos professores que já tive. Sei que não posso voltar atrás e, além disso, seria difícil aprender mais do que aprendi nas aulas - eu sempre prestei uma atenção inabalável (ou quase) às palavras que saíam da boca dos meus educadores. Acho que devia era ter conversado com eles. Perguntado mais (não me perdoo pelas vezes em que acintosamente consultei o relógio diante deles, rezando para que o sinal tocasse logo). Quantas oportunidades perdi de dizer o quanto os admirava?

Tento me consolar pensando que ainda dá tempo de conversar com cada um. E agradecer. Dizer o quanto cresci com a sabedoria que eles me deram e que o meu sonho é ser um pouco mais como eles. Ler os livros que eles leram, ver os filmes que eles viram, me dedicar arduamente ao estudo de tantas ciências interessantes, como eles se dedicaram. Não sei se consigo me aplicar tanto. Mas gostaria.

Enfim, continua a minha busca por aquela coisa sublime indefinível, cuja falta não me permite ser como a Wendy. Ou como a sereiazinha do conto homônimo de Hans Christian Andersen. Ou como os meus professores - seres reais, ainda assim inalcançáveis.

Nota: Se você não entendeu a citação à Ramsdale... Você não sabe o que está perdendo.